Manifestação de rua em meio à terceira onda é tão eficaz quanto cloroquina

A exemplo de Bolsonaro, seus rivais favoreceram a elevação do número de infectados e de mortos.

Por Josias de Souza
Colunista do UOL

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Para ser levado a sério, o “Fora, Bolsonaro” entoado nas ruas deste sábado precisaria de um complemento: “Mourão já”. Sem isso, as manifestações que encheram o asfalto serviram para duas coisas: expor a falta de nexo da oposição e presentear o coronavírus com muitas aglomerações.

A exemplo de Bolsonaro, seus rivais favoreceram a elevação do número de infectados e de mortos. Para quê? Ganha duas doses de vacina quem for capaz de responder. Que a popularidade do capitão derrete já se sabia. O Datafolha havia informado que a rejeição de Bolsonaro bateu em 54%.

Ironicamente, Bolsonaro virou um desastre sozinho. Não precisou do auxílio da oposição para se tornar um conto do vigário no qual 57,8 milhões de brasileiros caíram. Vendeu-se como político antissistema e anticorrupção. Acorrentou-se ao sistêmico centrão. E comanda uma organização familiar com fins lucrativos.

A pandemia deu um conteúdo fúnebre à inépcia do governo Bolsonaro. Num primeiro momento, morria-se de Covid. Desde dezembro de 2020, mês em que o Butantan e a Pfizer deixaram de entregar os milhões de doses que o Ministério da Saúde demorou a comprar, morre-se no Brasil de falta de vacina.

Arrisca-se a fazer papel de bobo quem imagina que os organizadores dos protestos deste sábado estão interessados no impeachment. Sobram razões para arrancar Bolsonaro do Planalto. O presidente comete crimes de responsabilidade em série. O que falta é interesse em levar às últimas consequências o “Fora, Bolsonaro” e, sobretudo, o “Mourão já.”

Os interesses ficarão mais nítidos à medida em que a CPI da Covid for se aproximando do final. Seguindo as pistas que Bolsonaro deixou, a comissão estabelece conexões entre as mortes e o negacionismo do presidente. Logo ficará claro que Bolsonaro cometeu, por ação ou omissão, crime comum e crime de responsabilidade.

O crime comum levará o relatório final da CPI à mesa do Procurador-Geral Augusto Aras, a quem cabe processar o presidente junto ao STF. O crime de responsabilidade recheará o 115º pedido de impeachment, a ser submetido ao presidente da Câmara, Arthur Lira.

Ainda que Aras ou Lira decidissem abrir as gavetas, o que não parece ser o caso, os processos só avançariam se 342 dos 513 deputados votassem contra Bolsonaro. Isso dificilmente ocorrerá. Por quê?

Simples: os organizadores das manifestações de rua, majoritariamente simpáticos à candidatura presidencial de Lula, estão de olho nas urnas de 2022. Querem enfraquecer eleitoralmente Bolsonaro, não trocá-lo por Mourão.

Na outra ponta, os aliados do presidente no centrão estão com os olhares voltados para o Diário Oficial. Querem Bolsonaro fraco para arrancar dele mais verbas e cargos, não para retirá-lo do trono.

Num instante em que o Brasil se apavora com a terceira onda de uma pandemia que está perto de produzir 500 mil mortos, o ronco da rua é mero charlatanismo. Favorece apenas o vírus. Na articulação do impeachment de Bolsonaro, é tão eficaz quanto a cloroquina no tratamento da Covid.

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