Por Aline Midlej
Cláudio Crespo, hoje com 47 anos, se fez essa pergunta no último ano do curso de Ciência Sociais, em 1995. Virou tema da dissertação de conclusão de curso e um questionamento que acompanharia o sociólogo por toda vida.
Mais de 20 anos depois, o agora analista do IBGE esteve à frente de um dos principais estudos sobre discriminação racial no país. Pela primeira vez na história, negros e pardos são maioria nas universidades públicas e foi Crespo quem deu essa e outras notícias como porta-voz do órgão, na semana passada.
“A sensação é de fazer parte de um processo histórico de transformação da sociedade. Estar ali, trazendo um debate central tem muito significado, pessoal e institucional. E localizo meu papel, minha formação encadeada com lutas históricas”, disse ele.
Quando o levantamento começou a ser planejado, ele ainda era diretor da área de Indicadores Sociais. Reforça que o trabalho e o sucesso dos resultados são coletivos, mas entende a importância da ocupação de espaços de liderança por negros: “A posição, seja na direção ou coordenação, permite e leva a uma reflexão maior junto às equipes de trabalho. É importante que seja assim”.
Hoje os negros são minoria no corpo de trabalho do IBGE e nos cargos de direção ainda mais. No entanto, Crespo garante que a preocupação está colocada lá: “O órgão tem um lugar importante nessa discussão, está na nossa rotina”.
Crespo sempre quis uma profissão que lhe desse entendimento sobre o mundo. Sobre as dificuldades que começaram cedo e, ele já entendia, refletia algo maior.
A primeira barreira foi o cerco da baixa escolaridade. Os pais, lutadores e engajados, sempre falaram sobre a importância dos estudos. A mãe cursou até a quarta série, o pai conseguiu encerrar o Ensino Fundamental: “Não tinha essa interlocução dentro de casa”.
A segunda veio na adolescência. Os pais preferiam uma profissão tradicional, que trouxesse estabilidade. “Mas naquela altura, a Sociologia já era uma perspectiva. O caminho das Ciência Humanas era importante para entender as vivências que eu tinha”, lembra.
Entrou na faculdade, se formou e, antes de mergulhar no mestrado, se envolveu em cursinhos pré-vestibulares voltados para jovens negros de Belford Roxo, região carente da Baixada Fluminense, onde cresceu e mora até hoje. O engajamento vem de família. Junto com o pai, técnico em eletrônica, participou de vários movimentos sociais desde cedo.
Perguntei se Crespo já sonhou com alguma manchete que retrate o país com o qual ele sonha: “Desejo que a cada divulgação a desigualdade se reduza, continuadamente, numa trajetória evolutiva, sólida e sustentável”.
E neste 20 de novembro, Crespo sugere uma reflexão: “As pessoas precisam observar e se questionar: o tema da desigualdade faz parte do seu dia-dia? Já se colocaram no lugar de quem sofre? Já fez uma reflexão mais ampla sem as suas certezas? As políticas públicas precisam colocar a desigualdade social como elemento central na equação do desenvolvimento”.
Onde estão os negros? No seu bairro, no seu trabalho, na sua comunidade?